A Formação dos Solos e seu Papel na Engenharia Geotécnica

por Márcio Leão em 19/Feb/2021
A Formação dos Solos e seu Papel na Engenharia Geotécnica

Você sabia que a combinação entre teorias científicas de áreas como a Física, Matemática, Engenharia, entre outras, permitiu a criação da mecânica dos solos? Conjuntamente a Mecânica de Rochas e Geologia de Engenharia, compõem a Engenharia Geotécnica, uma ciência multidisciplinar que coordena as propriedades dos materiais geológicos naturais (solos e rochas) e sua relação com projetos de engenharia que datam de muito tempo.

Podemos citar alguns casos históricos, como a escavação de estacas em solos moles próximos ao Nilo pelos egípcios, as estradas romanas que hoje servem como sub-base das atuais rodovias e as edificações e os recalques diferenciais apresentados pela Torre de Pisa, a qual representa o mais famoso problema geotécnico. No vídeo podemos ver como os solos influenciam o desempenho das construções.

 

Nos exemplos mencionados, você percebe que o solo está de alguma forma presente? O desenvolvimento do conhecimento permitiu o uso dos solos na construção (prédios, pontes, pavimentos etc.), associados ou não a outros materiais artificiais, podendo inclusive compor a própria estrutura de engenharia, como as barragens de terra.

Os problemas relacionados à engenharia de solos são vastos. Os solos apresentam distintas gêneses e ocorrem sob várias circunstâncias natureza. Muitos tipos de solos podem ser encontrados simultaneamente em um mesmo local e variar metricamente ou mesmo centimetricamente em profundidade.

Como você acha que podemos entender o comportamento dos solos em relação às condições impostas na prática da engenharia? Se pensarmos sobre sua origem e formação, deduziremos que se trata de um meio muito heterogêneo, o que dificulta a aproximação da teoria à realidade.

Independentemente da definição de solo, sabemos que esses materiais naturais são abundantes na natureza, recobrindo grandes extensões de nosso planeta devido à degradação da rocha, principalmente pelo intemperismo físico, químico ou biológico. Inevitavelmente, lidaremos com suas particularidades durante nossos projetos.

Vamos então relembrar um pouco sobre o intemperismo, processo tão importante na formação dos solos, principalmente em países tropicais como o Brasil? Podemos defini-lo como o fenômeno que altera as rochas e o qual se considera uma resposta a uma mudança de ambiente, que ocorre na interface atmosfera-litosfera. Considerando regiões tropicais, nas quais os efeitos intempéricos atuam fortemente nas rochas e na contínua maturidade dos solos, podemos esperar o desenvolvimento de extensos e profundos perfis geológicos de solo.

Um dos principais produtos do intemperismo são os solos residuais. Você se lembra de como eles são formados? Inicialmente, os intemperismos físico e químico atuam na rocha promovendo a desagregação física da mesma. Após a contínua ação intempérica, os blocos rochosos são fragmentados e reduzidos a partículas menores, deixando-os com formatos arredondados e dispersos na matriz de solo. Com a continuidade do processo, os fragmentos de rocha desaparecem e dão origem ao solo residual. Simples, não?

Nesses perfis podemos classificar as camadas de solo em horizontes. O horizonte A representa uma camada superficial orgânica. Já o horizonte B corresponde à camada de solo residual. Por fim, o horizonte C representa a rocha levemente alterada. Você sabe por que o entendimento do intemperismo é fundamental para o desempenho das obras de engenharia? Porque esse processo promove mudanças nas rochas, modificando suas propriedades geotécnicas. Dessa forma, é de suma importância compreender como essas propriedades variam conforme a rocha-mãe se altera até que se torne solo.

Imagine a necessidade de executar uma edificação sobre um maciço de rocha alterada ou solo residual. O ideal é que as fundações pudessem ser apoiadas diretamente na rocha de melhor qualidade (rocha sã). Dependendo da ação dos agentes formadores do solo e das características das rochas, essa escavação até o maciço rochoso são pode representar um grande volume de material e consequentemente aumentar o custo e inviabilizar o projeto.

Vamos construir um pensamento crítico considerando o intemperismo em projetos de engenharia, utilizando como exemplo as barragens. As condições geológico-geotécnicas do maciço de fundação para esses projetos influenciam diretamente os aspectos construtivos. Quando essas condições são interpretadas de forma equivocada, a geração de incertezas é grande e prejudica não apenas a segurança da obra, mas também aumenta ou inviabiliza o projeto em si. Qual seria o impacto disso? Essas incertezas levam à adoção de cotas de fundação próximas ou junto ao topo rochoso, o que em países de clima tropical pode representar elevados volumes de solo a serem escavados, aumentando o custo da obra. Cabe ressaltar, que é muito comum a ocorrência de materiais transicionais (horizonte C) inseridos nesses espessos maciços de solo residual, gerando distintos comportamentos geotécnicos. Você compreendeu como a incerteza sobre um determinado horizonte é capaz de alterar a concepção de um projeto?

A presença desses produtos mistos do intemperismo, ou seja, dessas camadas geológicas compostas por solos e rochas (transicionais) fornece um comportamento geomecânico anisotrópico, isto é, diferente em função da direção que analisamos, acarretando grandes problemas geotécnicos caso não exista um claro entendimento sobre essa característica.

Fonte: LEÃO, M. F.. Fundamentos em Mecânica dos Solos. 1. ed. Campinas: Kroton, 2018. v. 1. 250p .

 

Márcio Leão

É Pós-Doutor em Geotecnia pela UFV, Doutor em Geologia de Engenharia pela UFRJ, Doutorando em Geotecnia pela UERJ, Mestre em Geotecnia pela UERJ, Mestre em Geologia de Engenharia pela UFRJ, possui MBA em Gestão de Projetos pela USP e Bacharel em Geologia pela UFRJ. Geólogo com 13 anos de experiência em planejamento de obras de arte de engenharia civil, nacionais e internacionais. É Docente de Graduação e Pós-graduação. É Pesquisador e Consultor nas áreas de Geologia de Engenharia e Geotecnia, com ênfase em mecânica das rochas, mecânica dos solos, barragens, túneis, taludes e meio ambiente, investigações de campo e ensaios de laboratório e in situ, bem com instrumentação geotécnica. É Membro de Comissões Técnicas, de Corpo Editorial e Revisor Ad hoc de Periódicos nacionais e internacionais.

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