A responsabilidade do processo de licenciamento ambiental nos acidentes na mineração

por Yash Rocha Maciel em 22/Apr/2019
A responsabilidade do processo de licenciamento ambiental nos acidentes na mineração

Muito tem se falado sobre Licença Ambiental após o ocorrido em Brumadinho, e de forma equivocada. Um exemplo simples seria o licenciamento de um empreendimento residencial, enquadrado com porte e potencial poluidor suficiente para seguir o ritual do licenciamento. Ora, se um prédio vem a sucumbir gerando vítimas, o processo de licenciamento não avalia se o projeto é seguro ou não, isso é Responsabilidade Técnica - RT de quem planejou, projetou e conduziu a implantação do empreendimento, ou seja, uma responsabilidade profissional de engenharia de pessoas ligadas a uma instituição pública ou privada.

A empresa de consultoria ambiental recebe o projeto, faz o diagnóstico ambiental das Áreas de Influência – AIDs onde o mesmo irá ou não se instalar e indica os possíveis impactos incidentes sobre o meio físico, biótico e antrópico. Feito isso, a mesma monta o Plano de Controle Ambiental - PCA para os impactos negativos reversíveis de forma a eliminar, mitigar e monitorar os mesmos e, impulsionar os impactos positivos, quando possível. Já os impactos irreversíveis, por vezes muito ligados à vegetação, mas com reflexos na fauna e no meio físico, são compensados de acordo com o que prevê a legislação.

Dito isso, é possível afirmar com clareza que o processo de licenciamento ambiental não tem relação com a segurança estrutural dos empreendimentos.

As carências para evolução dos projetos de mineração, avaliações de impacto e controles ambientais

Existem duas grandes fontes do conhecimento que ainda estão longe dos Estudos de Impactos Ambientais no processo de licenciamento ambiental, e são elas a engenharia e a ciência da terra voltadas para o diagnóstico e a proposição de medidas de controles ambientais, de forma a atender o que realmente interessa nas áreas impactadas pelos empreendimentos.

O diagnóstico ambiental bem como as medidas para tratar os impactos são ainda muito rasos e genéricos em alguns temas, bem como a engenharia e a ciência da terra pouco evoluídas para tratar questões que deveriam ser analisadas de forma particular em cada região/área que sofrerá a intervenção.

A exemplo disso, tem-se que o estudo mais complexo exigido nos processos de licenciamento ambiental, denominado legalmente como Estudo de Impacto Ambiental – EIA, por vezes, não oferece a devida maturidade nos itens que tratam do empreendimento em si – denominada Caracterização do Empreendimento - muito menos dos impactos que este causará nas Áreas de Influência, ponto principal e foco objetivo do estudo, a aclamada de Avaliação de Impacto Ambiental - AIA.

No âmbito dos estudos, o que se tem percebido é uma especialização dos profissionais no item de Diagnóstico Ambiental, que muito retrata o que existe nas Áreas de Influência, mas que pouco é utilizado para se chegar a uma avaliação e proposição de medidas de atenuação e eliminação dos possíveis impactos esperados.

De forma geral, o que se tem são projetos imaturos, diagnósticos superestimados em temas pouco ou menos relevantes e avaliações de impactos sem ciência, subjetivas e ainda carentes de técnica.

A distante Licença Social dos empreendimentos

Não menos importante que o tratado nas carências para a evolução dos projetos de mineração, são as questões antrópicas (sociais, econômicas e de infraestrutura), bem como a divisão das responsabilidades em impulsionar os impactos positivos trazidos pela mineração. Exemplo disso são as Avaliações de Impactos Ambientais, que trazem muito sobre os impactos negativos no meio físico e biótico, ao passo que tratam as questões positivas somente no que tange às repercussões econômicas diretas dos empreendimentos, como a movimentação da economia local pela compra de insumos, pagamento de impostos, taxas, geração de empregos e pagamento da Compensação Financeira pela Exploração Mineral – CFEM. Essa discussão dos impactos positivos deveria extrapolar os limites da responsabilidade do empreendedor, direcionando-a para os Municípios e Estado, uma vez que estes ficam com a maior parte dos bônus financeiros da atividade mineral.

O que ainda se tem é uma relação paternalista do empreendedor para com as comunidades das Áreas de Influência, que não tem poder para alavancar e impulsionar os impactos positivos, pois isso é responsabilidade da política pública, principalmente. Exemplo clássico disso são as comunidades nas Áreas de Influência Direta dos empreendimento que, na maioria das vezes, não têm nem água tratada e isso é responsabilidade do poder público.

O conceito de Licença Social é um termo cada vez mais utilizado, mas longe e até mesmo impossível de acontecer com a forma de atuação hoje percebida dos interessados e beneficiados extra empreendimento. A responsabilidade pela Licença Social foge das mão do empreendedor ou, no mínimo, não é responsabilidade somente dele, já que o mesmo não é o único beneficiado pelo seu empreendimento. Para tê-la de forma unilateral, o empreendedor teria que assumir o papel do Estado, tirando, inclusive, a lisura do processo de licenciamento e operação da sua unidade. Obviamente que se os impactos do empreendimento afetam os serviços ambientais das Área de Influência em temas ligados à responsabilidade dos Municípios e Estado, o mesmo é sim responsável por tratar as adversidades trazidas. Ou seja, por exemplo, se o empreendimento afeta a qualidade da água e essa é utilizada para abastecimento público, o empreendedor deve arcar com a solução do problema, ao preço de ter, inclusive, a viabilidade ambiental do seu empreendimento descaracterizada.

O direito de minerar não pode ser maior do que o da população em ter acesso aos serviços ambientais da natureza, sejam eles ligados à dignidade humana, como o fornecimento de água, ou até mesmo de apropriação cultural do lugar, da paisagem e das relações sociais existentes nas comunidades.


Yash Rocha Maciel

Geógrafo Especialista em Desenvolvimento Sustentável. 15 anos de experiência em Assessoria Estratégica Ambiental, Licenciamento Ambiental, Gestão de Recursos Hídricose Saneamento, Gestão de Projetos, Programas e Tecnologias Ambientais.

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